Jornal da Mulher Brasileira


Edição nº 17 - de 15 de Junho de 2003 a 14 de Julho de 2003

Olá Leitores!

A edição 17 contou com a colaboração da Psicóloga Rosângela Barqueiro, que intermediou para nós uma excelente pesquisa sobre a legislação que envolve pessoas portadoras de deficiências, de autoria do dr. Ricardo Tadeu Marques da Fonseca(*). Além disso, trazemos muitas notícias

sobre eventos e as datas comemorativas.

Agradecemos muitas outras colaborações que recebemos, as quais estão sendo analisadas para uma veiculação futura.

Esperamos mais notícias, críticas e sugestões, e além disso, a divulgação deste nosso trabalho. Com votos de sucesso. Abraço de Elisabeth Mariano e equipe Jornal da Mulher Brasileira.

Para informações, críticas, sugestões, envio de notícias, para anunciar, contate-nos.

THEMIS SELECIONA ONGS PARA PROJETO DE MULTIPLICAÇÃO PROMOTORAS LEGAIS POPULARES

"A ONG Themis - Assessoria Jurídica e Estudo de Gênero (Porto Alegre / RS) abriu licitação pública para selecionar ONGs interessadas em participar do Projeto de Multiplicação da Metodologia de Promotoras Legais Populares, por meio da capacitação, em Porto Alegre, de integrantes das instituições selecionadas. Desde 1993, a Themis desenvolve o Curso de Formação de Promotoras Legais Populares e já teve duas experiências de capacitação de ONGs. Informações: samantha@themis.org.br."

(Fonte: ABONG)

III FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO

O III Fórum Mundial de Educação realizar-se-á em Porto Alegre, RS, Brasil, de 29 a 31 de julho de 2004, nesta ocasião lançar-se-á a Plataforma Mundial de Educação, com as propostas e definições elaboradas nos Fóruns Regionais.

(Fonte: Fórum Mundial de Educação)

I CONGRESSO DE MARKETING EDUCACIONAL

Realizado pelo Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (SEMESP), entre os dias 12 e 14 de junho, no Centro de Convenções Pompéia, ocorreu o I Congresso de Marketing Educacional, reunindo mantenedores, dirigentes, diretores e gerentes de marketing pertencentes a mais de 400 instituições de ensino superior, e representantes de agências de publicidade, assessorias de imprensa e consultorias de marketing e comunicação.

NA BOCA DO POVO

Como iniciativa e promoção da Prefeitura de Santo André / SP de 9 a 11 de junho ocorreu o evento "Na Boca do Povo". Com a participação de nobres representantes do setor de comunicação de São Paulo, foram analisadas as diversas faces da mídia. Dentre os temas foram discutidos: "Televisão - Comunicação e Identidade"; "Mídia e Governo - Além da Notícia"; "A Cultura na Comunicação e a Comunicação da Cultura"; "Executivo e Legislativo - A Cobertura da Mídia"; "Marketing Político e Governo",

(Fonte: http://www.santoandre.sp.gov.br)

COMEMORAÇÃO DO DIA INTERNACIONAL DO BRINCAR

Como promoção da Associação Brasileira de Brinquedotecas e de LARAMARA - Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual, IPA - Aliança Pela Infância, ocorreu a comemoração do Dia Internacional do Brincar, em 28 de maio, no auditório da LARAMARA. Alem de oficinas e brincadeiras, o prof. Celso Antunes proferiu a conferência "Brincar, Dizer, Falar". Também houve apresentação das entidades que apoiaram o evento, apresentação do Balé da Instituição Padre Chico, exposição de painéis, fotos, brinquedos, obras de arte de crianças e venda de livros e brinquedos.

No encerramento realizou-se uma Dinâmica Lúdica com Bumerangues.

(Fonte: LARAMARA)

PESQUISA

O MERCADO DE TRABALHO E AS LEIS DE AÇÃO AFIRMATIVA EM PROL DA PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA

Ricardo Tadeu Marques da Fonseca (*)

I- A legislação brasileira atual e o trabalho do portador de deficiência

A Constituição de 1988 é a primeira Carta Constitucional que enfatiza, sobremaneira, a tutela da pessoa portadora de deficiência no trabalho.

O artigo 1º elege como valores fundantes da República a dignidade da pessoa humana, a cidadania, bem como o valor social do trabalho e da livre iniciativa. O artigo 3º, ao seu turno, obriga o Estado Brasileiro a adotar medidas para: "construir uma sociedade livre, justa e solidária; (...); erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação". O art. 7º, inciso XXXI, preceitua: "proibição de qualquer discriminação no tocante a salário ou critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência".

Estes dispositivos são de vital importância, como se vê, pois a nação brasileira assume o compromisso de admitir o portador de deficiência como trabalhador, desde que sua limitação física não seja incompatível com as atividades profissionais disponíveis.

O art. 37, inciso VIII, também da Constituição Federal, determina que "A lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão".

Na esfera privada, também se institui a obrigatoriedade de reserva de postos a portadores de deficiência. A Lei nº 8.213/91 fixa os seguintes percentuais: "A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:

-até 200 empregados: 2%

-de 201 a 500 empregados: 3%

-de 501 a 1.000: 4%

-de 1001 em diante: 5%

A Lei nº 8.112, neste diapasão, impõe que a União reserve, em seus concursos, até 20% das vagas a portadores de deficiências, havendo iniciativas semelhantes nos Estatutos Estaduais e Municipais, para o regime dos servidores públicos.

O art. 203, inciso IV, da Constituição, inclui entre os deveres da assistência social "a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária".

O inciso V, do mesmo artigo, dispõe que os deficientes e idosos incapazes de se manter pelo próprio trabalho ou por auxílio da família, terão direito a uma renda mensal vitalícia equivalente a um salário-mínimo, mediante regulamentação de norma específica, que veio pela Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (art. 20).

O art. 208, inciso III, da Constituição, arrola entre os deveres do Estado, na órbita da atividade educacional, a oferta de escolas especializadas para portadores de deficiência.

O art. 227, também da Constituição, grande monumento da doutrina da proteção integral da criança e do adolescente, no inciso II, fala na "Criação de programas de prevenção e atendimento especializado para os portadores de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos".

Regulamentando o dispositivo acima, a Lei nº 7.853, de outubro de 1989, cria a CORDE (Coordenação Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência), estabelece mecanismo de tutela dos interesses difusos das pessoas deficientes, pelo Ministério Público, impõe a priorização das medidas de integração dos deficientes no trabalho e na sociedade, institui as Oficinas Protegidas de Trabalho e define como criminosa a conduta injustamente discriminatória de deficientes no trabalho.

Dispõe, ainda, em seu artigo 2º, inciso III, letra "d", que cabe ao Poder Público e a seus órgãos assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive do direito ao trabalho, devendo ser dispensado tratamento adequado tendente a viabilizar a adoção de legislação específica, disciplinando a reserva de mercado de trabalho em favor dessas pessoas, nas entidades da Administração Pública e do setor privado, e regulamentando a organização de oficinas e congêneres integradas ao mercado de trabalho, e a situação, nelas, das PPDs.

Tanto a Constituição quanto a lei ordinária traçam enunciados, princípios, cuja aplicação vinha se fazendo de forma casuística, nos vários níveis da Federação.

Proliferaram leis municipais, estaduais ou mesmo editais, adotando critérios profundamente díspares, os quais suscitaram dúvidas de aplicação, ou mesmo inviabilizaram o Direito contemplado nos instrumentos normativos retro-mencionados.

O Decreto 3.298 regulamenta a Lei 7.853, implementando mecanismos para a concretização da reserva de vagas nos concursos públicos.

Dedica à matéria os artigos 37 a 44, traçando, a partir da experiência acumulada, novas diretrizes visando a superação de problemas enfrentados pelos portadores de deficiência, que se confrontavam com regras que, à guisa de regulamentar a reserva de vagas, findavam por inviabilizar a aprovação daqueles candidatos.

Garante-se a igualdade de condições das PPDs aos demais candidatos quanto à inscrição, observando-se, outrossim, o percentual mínimo de 5% de vagas reservadas. Excetuam-se desta regra os cargos em comissão ou função de confiança, ou aqueles cujo exercício demande aptidão plena. Grande avanço se obteve, ao se fixar o percentual mínimo de 5%. A maioria das leis estaduais e municipais falavam em até 5%, o que possibilitava a fixação de percentuais irrisórios.

Disciplinam-se, ademais, as regras que deverão constar dos editais, pautando-as por critérios concernentes à cidadania do candidato portador de deficiência. Com o intuito de fixar condições de igualdade, o decreto determina que a autoridade competente não pode obstar a inscrição do deficiente, que, por sua vez, deve declarar e comprovar sua condição, indicando os instrumentos de adaptação que poderá necessitar durante a realização do concurso e do estágio probatório. Devem estar previstos, também, o número de vagas existentes e o total correspondente à reserva destinada às PPDs, bem como as atribuições e tarefas essenciais dos cargos a serem ocupados.

A pessoa portadora de deficiência participará do concurso em igualdades de condições com os demais candidatos, no que se refere ao conteúdo e avaliação das provas, aos critérios de aprovação, ao horário e ao local de aplicação dos exames, a nota mínima exigida para todos os demais candidatos e a publicação dos resultados finais.

Assinale-se que o critério de avaliação deverá ser o mesmo utilizado para todos os candidatos, portadores ou não de deficiências. As regras anteriores ao decreto normalmente atribuíam a uma comissão médica o dever de aferir, após a aprovação no concurso e antes do estágio probatório, se a deficiência apresentada pelo candidato seria compatível com a função a ser exercida, o que impunha duplo ônus às PPDs. Deviam ser aprovadas no concurso e pela comissão médica e ter o aval dessa comissão para se submeterem ao estágio probatório.

Buscou-se afastar essa injustiça inserindo-se, na Comissão, membros da carreira a ser abraçada pelo candidato. Conferiu-se àquela comissão, ademais, o dever de avaliar os instrumentos que o candidato necessitará durante o concurso, bem como, em caso de aprovação, o dever de acompanhá-lo durante o estágio probatório, assegurando-lhe os instrumentos e meios de apoio necessários para a sua integração.

Na esfera privada, o decreto delineia a inserção competitiva, a inserção seletiva, as oficinas protegidas e o trabalho independente, autônomo.

Aponta a inserção competitiva como sendo aquela em que a PPD ingressa no mercado de trabalho em condições de quase absoluta igualdade com qualquer outro trabalhador, no que concerne à execução do seu trabalho, necessitando, tão somente, de apoios instrumentais que supram suas restrições físicas ou sensoriais.

A inserção seletiva dar-se-á quando forem necessários, além dos instrumentos de apoio, procedimentos especiais, como horário diferenciado, adaptação do meio ambiente, atuação de orientadores ou acompanhantes, etc.

Nos dois casos, na inserção competitiva ou na inserção seletiva, serão garantidos todos os direitos trabalhistas e previdenciários. Admite a inserção seletiva por intermediação de entidades especializadas.

O decreto incentiva, outrossim, o trabalho independente, por meio das chamadas cooperativas sociais, reguladas pela Lei 9.867/99.

Há que se atentar, porém, para as possíveis fraudes, tão usualmente encontradas entre as cooperativas de trabalho.

As oficinas protegidas são aquelas que se encontram no interior de entidades que desenvolvem trabalhos terapêuticos, visando a preparação do portador de deficiência para um futuro processo seletivo ou competitivo de trabalho. Tal procedimento é indispensável com relação a algumas deficiências mentais ou físicas, cujo grau de comprometimento afete os processos de sociabilização das PPDs.

As oficinas protegidas podem ser de produção ou meramente terapêuticas. Tanto nas primeiras como nas segundas não haverá, em tese, vínculo de emprego, exceto nas de produção, desde que presentes os elementos legais caracterizadores da relação de emprego.

Finalmente, o ECA, em seu art. 66, também obriga a que a sociedade brasileira atente para a proteção do trabalho do adolescente deficiente, o que faz com acerto, posto que duplas são as peculiaridades do adolescente portador de deficiência, as quais suscitam necessidade mais intensa de proteção, para que se lhe possibilite a integração adequada na sociedade, afastando-o da política de caridade meramente assistencial, que o impelirá inexoravelmente à marginalidade.

É com esta intenção que a Lei do Estágio amplia o estágio profissionalizante às escolas especiais de qualquer grau.

O direito à profissionalização assume, aqui, papel imprescindível de socialização do portador de deficiência, eis que suas limitações para o trabalho se constituem em barreiras tão somente instrumentais, mesmo que seja ele portador de deficiência física, mental, ou sensorial. Todas elas são superáveis, desde que se rompam os preconceitos atávicos, herdados, talvez, das concepções antigas dos povos primitivos, de que o portador de deficiência é um "pecador punido por Deus" que deve ser segregado.

II - O mercado de trabalho e a aplicação da lei.

Muitos problemas têm sido encontrados na prática para que a lei se faça cumprir. Na administração Pública, o principal empecilho para as contratações é o critério médico que, na maioria dos editais, acaba por se colocar como barreira intransponível. Os médicos tendem a vetar a contratação argumentando que a deficiência é incompatível com a função.

A primeira medida que deveria ser tomada é a generalização da idéia de que os médicos devem ser acompanhados por membros da carreira escolhida pelo candidato, cabendo a esta comissão apenas ratificar a deficiência alegada na inscrição e indicar quais os instrumentos necessários para o concurso e para o desempenho da função. Somente na inexistência destes, alegar a incompatibilidade.

Outra questão diz respeito a concursos para portadores de deficiência mental que vêm reivindicando certames de demanda específica para a tarefa respectiva, sem exigência de níveis de escolaridade.

Nas relações privadas de trabalho a questão é mais complexa, pois a visão assistencialista que predomina na legislação e nas próprias entidades que atuam com deficientes tem impedido a verdadeira integração.

A intermediação de mão-de-obra por associações na forma do estágio e da inserção seletiva, tem sido exagerada e injustificada. Os trabalhadores portadores de deficiência têm recebido salários reduzidos e tratamento injustamente discriminatórios. Por outro lado, o beneficio assistencial, concedido aos portadores de deficiência, finda por desencorajá-los ao ingresso no mercado de trabalho, o qual exclui o benefício em questão.

É urgente a criação de um beneficio previdenciário, semelhante ao auxílio-acidente, que deverá ser pago a todo portador de deficiência que, vencendo suas dificuldades, habilite-se para o trabalho. É o que ocorre em situação semelhante aos trabalhadores que se acidentam e se reabilitam. Passam, então, a perceber um beneficio duradouro, suplementar denominado auxílio-acidente.

A mesma medida deveria ser oferecida, como dizíamos, aos trabalhadores que superam a condição de dependentes e habilitam-se para ingressar no mercado pela primeira vez, sobrepujando, assim, seus limites físicos, sensoriais ou mentais.

Alguns defendem que o ingresso no mercado de trabalho poderia apenas suspender o pagamento do beneficio assistencial, que voltaria no caso de desemprego. Não parece a melhor medida porque uma vez inserido no mercado, o portador de deficiência perde a condição de assistido e é bom que isto ocorra. O pagamento do auxílio habilitação, acima sugerido, justificar-se-ia plenamente porque os esforços despendidos pelo portador de deficiência são sempre mais evidentes e, para a Previdência, interessa tê-lo como contribuinte do sistema. O valor do beneficio sugerido pode ser limitado, mas será a melhor forma de ruptura com o viés assistencialista que hoje impera.

Outra alternativa que parece interessante é a implementação de contratos de aprendizagem para adolescentes de 14 a 18 anos intermediado por entidades que deverão se qualificar para a verdadeira formação profissional. Seriam contratos formais, com registro em Carteira e com observância de um curso de formação profissional com duração de até dois anos. Não se trata de estágio, nem de inserção seletiva.

A maior dificuldade alegada pelas empresas, para o cumprimento das cotas, é a falta de qualificação profissional. A Lei 10.097/2000 propicia a atuação de entidades sem fins lucrativos nos moldes supra sugeridos.

Há que se superar, também, a mentalidade neo-liberal que está precarizando todas as relações de trabalho e, a inserção de PPDs no mercado de trabalho viria em boa hora para demonstrar o desacerto das políticas que imperaram nas últimas décadas, eis que o direito do trabalho é o maior instrumento no modelo de produção capitalista para a preservação da dignidade no trabalho.

Cabe ao Direito do Trabalho, assim, despir-se dos preconceitos e buscar, cientificamente, a compreensão dos reais limites dos deficientes para, cumprindo seu papel histórico, garantir-lhes condições de igualdade plena aos demais trabalhadores.

A reserva de vagas na Administração Pública ou nas empresas privadas jamais poderá ser considerada como uma proteção paternalista; trata-se, isto sim, da própria revelação da essência do Direito do Trabalho, o qual nasce da premissa básica de que a lei deve assegurar a igualdade real entre as pessoas, suprindo as desigualdades que se constituam em fatores de segregação.

Curitiba, 19 de março de 2003

(*) Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, Procurador Regional do Ministério Público do Trabalho - 9ª Região, Professor de Direito do Trabalho da Faculdades do Brasil, Especialista e Mestre em Direito do Trabalho pela Universidade de São Paulo e Doutorando pela Universidade Federal do Paraná.